IER60808: Redes locais sem-fio

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O padrão IEEE 802.11 define uma tecnologia de redes locais sem-fio (WLAN), mais conhecida como WiFi. Esse tipo de rede tem como algumas características o baixo custo dos dispositivos, facilidade de utilização e boas taxas de transmissão em curtas distâncias (algumas dezenas de metros). Apesar de ter sido projetada para redes locais, essa tecnologia também tem sido usada para redes de média distância (alguns km). No entanto, para distâncias mais longas o padrão precisa ser adaptado para que funcione de forma eficiente. Para entender como criar enlaces de acesso sem-fio de alguns quilômetros usando esse tipo de tecnologia, é necessário entender seus princípios de funcionamento.

Estrutura de uma rede IEEE 802.11

Uma rede local sem-fio (WLAN) IEEE 802.11 é implantada por um equipamento especial chamado de ponto de acesso (AP - Access Point). Esse equipamento estabelece uma WLAN, de forma que computadores, smartphones, PDAs, laptops, tablets (e outros dispositivos possíveis) possam se comunicar pelo canal sem-fio. Esses dispositivos são denominados estações sem-fio (WSTA - Wireless Station), e se comunicam usando o AP como intermediário. Isso significa que todas as transmissões na WLAN são intermediadas pelo AP: ou estão indo para o AP, ou vindo dele. Além disso, uma WSTA somente pode se comunicar na WLAN se primeiro se associar ao AP - isto é, se registrar no AP, sujeitando-se a um procedimento de autenticação.

Do ponto de vista da organização da WLAN, a menor estrutura possível é o BSS (Basic Service Set), mostrado na figura abaixo. Um BSS é formado por um AP e as WSTA a ele associadas. O BSS possui um nome, identificado pela sigla SSID (Service Set Identifier), que deve ser definido pelo gerente de rede. O BSS opera em um único canal, porém as transmissões podem ocorrer com diferentes taxas de bits (cada quadro pode ser transmitido com uma taxa, dependendo da qualidade do canal sem-fio conforme medida pela WSTA que faz a transmissão). Por fim, apenas uma transmissão pode ocorrer a cada vez, o que implica o uso de um protocolo de acesso ao meio (MAC) pelas WSTA e AP.


Wlan1.png


O AP opera em nível de enlace, de forma parecida com um switch ethernet (porém sua tarefa é um pouco mais complexa ...). Isso quer dizer que o AP não usa o protocolo IP para decidir como encaminhar os quadros das WSTA, e assim não faz roteamento. Uma consequência desse modo de operação do AP é que a junção de dois ou mais AP por meio de um switch ethernet, com seus respectivos BSS, faz com que WSTAs em diferentes BSS possa se comunicar como se fizessem parte da mesma rede local. A união de dois ou mais BSS, mostrada na figura a seguir, se chama ESS (Extended Service Set). Em um ESS, todos os BSS possuem o mesmo SSID. No entanto, ao se criar um ESS deve-se cuidar para evitar que BSS vizinhos usem o mesmo canal.

Wlan2.png


As redes IEEE 802.11b e IEEE 802.11g usam a frequência 2.4 GHz para seus canais, que são espaçados a cada 5 MHz. As redes IEEE 802.11n usam frequências de 2.4 ou 5 GHz. O pádrão mais recente, IEEE 802.11ac, usa exclusivamente 5 GHz. No caso de IEEE 802.11n, ainda a mais comum de ser usada, quando na banda de 2.4 GHz os canais são numerados de 1 a 11. Quando usa modo de modulação com largura de 20 MHz, apenas três dentre onze canais (no máximo) não apresentam sobreposição. Isso ocorre porque cada canal tem largura de 5 MHz. A tabela abaixo mostra os canais usados em IEEE 802.11n, indicando a lista de canais interferentes de cada canal.

Wlan-canais.png

Quando se usa modulação com largura de 40 MHz, apenas um canal pode ser usado (o canal 6), pois toda a banda disponível é usada.

No caso da banda de 5 GHz há muito mais canais, e as combinações de canais não-sobrepostos se torna mais complexa:

PJI3-Wifi-5ghz.jpg

Sistemas de Distribuição

Uma típica WLAN com estrutura distribuída pode ser criada explorando-se o conceito de Sistema de Distribuição (DS - Distribution System).

Em uma rede IEEE 802.11, vários BSS podem se combinar para formarem um ESS (Extended Station Set). A interligação entre os AP deve ser feita em nível de enlace, seja por uma rede cabeada ou por links sem-fio. Essa interligação é denominada Sistema de Distribuição, estando exemplificada na figura abaixo:


80211-ds.png


O sistema de distribuição funciona como uma ponte entre as WSTA, como mostrado na figura abaixo. Assim, se dois AP forem interligados, as WSTA que pertencem a seus BSS poderão se comunicar como se estivessem na mesma rede local.


80211-ds2.png


Sistemas de distribuição podem ser implantados usando o próprio canal sem-fio, sendo assim denominados WDS (Wireless Distribution System).

Pji3-80211-wds.png


A cobertura de uma área envolve um planejamento que leve em conta as taxas mínimas desejáveis e as características dos equipamentos (potências de transmissão e ganhos de antenas) e do ambiente (existência de obstáculos, reflexões, e fontes de ruído). Além disso, deve-se minimzar a interferência entre BSS vizinhos, o que pode ser feito escolhendo-se canais que não se sobreponham. A figura abaixo mostra conceitualmente como se podem escolher os canais dos AP para atingir esse objetivo (no caso, para banda de 2.4 GHz e canais de 20 MHz).

80211-freq-planning.png


Desta forma, podem-se criar BSS para cobrir uma área e aproveitar melhor a capacidade do meio de transmissão.

80211-cobertura.png

Deve-se levar em conta que a qualidade do sinal tem relação com a modulação usada (e da taxa de dados), assim o limiar entre um BSS e outro depende de como as estações medem a qualidade de sinal e quais as taxas mínimas aceitáveis. A figura abaixo ilustra possíveis alcances para diferentes taxas de dados.

80211-ranges-rates.png
Taxas em função da distância do AP (exemplo, pois depende das condições do ambiente e dos equipamentos)

Considerações sobre implantação de redes locais sem-fio

Vimos que, para ampliar a cobertura de uma rede sem-fio IEEE 802.11, usam-se vários AP interligados em um Sistema de Distribuição (DS). Uma das maiores dificuldades ao se implantar uma rede sem-fio é determinar:

  • quantos AP são necessários
  • onde devem ser instalados
  • qual o canal e potência de transmissão a serem usados em cada AP.

Existem algumas técnicas para estimar a cobertura de cada AP, dados sua potência de transmissão e as características do ambiente em que se encontra (paredes, portas, outros obstáculos). Um bom resumo pode ser encontrado no TCC "Estudo e projeto para o provimento seguro de uma infra-estrutura de rede sem fio 802.11" de Cesar Henrique Prescher, defendido em 2009. Mas mesmo que se apliquem as recomendações ali descritas, ao final será necessário fazer uma verificação em campo da rede implantada. Para isso deve-se medir a qualidade de sinal sistematicamente na área de cobertura, para identificar regiões de sombra (sem cobertura ou com cobertura deficiente) e de sobreposição de sinais de APs. Tal tarefa implica o uso de ferramentas apropriadas e da aplicação de medições metódicas.

O MAC CSMA/CA

O protocolo MAC usado em redes IEEE 802.11 se chama CSMA/CA (Carrier Sense Multiple Access/Collision Avoidance). Ele foi desenhado para prover um acesso justo e equitativo entre as WSTA, de forma que em média todas tenhas as mesmas oportunidades de acesso ao meio (entenda isso por "oportunidades de transmitirem seus quadros"). Além disso, em seu projeto foram incluídos cuidados para quue colisões sejam difíceis de ocorrer, mas isso não impede que elas aconteçam. Os procedimentos e cuidados do MAC para evitar e tratar colisões apresentam um certo custo (overhead), que impedem que as WSTA aproveitem plenamente a capacidade do canal sem-fio. Consequentemente, a vazão pela rede sem-fio que pode de fato ser obtida é menor que a taxa de bits nominal (por exemplo, com IEEE 802.11g e taxa de 54 Mbps, efetivamente pode se obter no máximo em torno de 29 MBps).

O protocolo CSMA/CA implementa um acesso ao meio visando reduzir a chance de colisões. Numa rede sem-fio como essa, não é possível detectar colisões, portanto uma vez iniciada uma transmissão não pode ser interrompida. A detecção de colisões, e de outros erros que impeçam um quadro de ser recebido pelo destinatário, se faz indiretamente com quadros de reconhecimento (ACK). Cada quadro transmitido deve ser reconhecido pelo destinatário, como mostrado abaixo, para que a transmissão seja considerada com sucesso.

Wlan-ack.png
Envio de um quadro de dados, com subsequente reconhecimento (ACK)


O não recebimento de um ACK desencadeia uma retransmissão, de forma parecida com o procedimento de retransmissão do CSMA/CD ao detectar colisão. Antes de efetuar uma retransmissão, o MAC espera um tempo aleatório denominado backoff (recuo). Esse tempo é sorteado dentre um conjunto de possíveis valores que compõem a Janela de Contenção (Cw - Contention Window), representados no intervalo [0, Cw]. O valor de Cw varia de (15 para IEEE 802.11a/g/n e 31 para 802.11b) a (1023), e praticamente dobra a cada retransmissão de um mesmo quadro. A figura abaixo ilustra as janelas de contenção para retransmissões sucessivas.

Wlan-backoff.png
Backoff para retransmissões sucessivas


Resumidamente, o protocolo MAC usa basicamente dois mecanismos principais para fazer o acesso ao meio:

  • Antes de uma transmissão, verifica-se se o canal está livre. Caso não esteja, deve-se primeiro aguardar que fique livre.
  • Cada quadro transmitido deve ser confirmado pelo receptor. Isso quer dizer que o receptor deve enviar um quadro de confirmação para o transmissor (ACK). Se esse quadro ACK não for recebido, o transmissor assume que houve um erro. Nesse caso, o transmissor faz uma retransmissão.
  • Antes de uma retransmissão o transmissor se impõem um tempo de espera aleatório chamado de backoff. A duração máxima do backoff depende de quantas retransmissões do mesmo quadro já foram feitas.


A figura abaixo ilustra um cenário em que cinco WSTA disputam o acesso ao meio. Repare os backoff feitos pelas WSTA antes de iniciarem suas transmissões. Esse backoff sempre precede uma transmissão quando a WSTA for verificar o canal sem-fio e o encontra ocupado (pense em por que o MAC deve fazer isso ...).

Wlan-csmaca.png


Por fim, o MAC CSMA/CA usado nas redes IEEE 802.11 define uma formato de quadros, mostrado na figura abaixo. Note que ele é diferente do quadro ethernet, e portanto o AP precisa traduzir os cabeçalhos de quadros que viajam da rede cabeada para a WLAN, e vice-versa. Note também que os endereços MAC do CSMA/CA são os mesmos que em redes ethernet.


Wlan-frame.png

Atividade

Para estes experimentos serão usados três pontos de acesso TP-Link TL-WDR4300 ou TP-Link Archer AC1750

Parte 1: Um ESS com sistema de distribuição cabeado

80211-ds.png
Um sistema de distribuição usando uma LAN cabeada

  1. Configure o rádio 2.4GHz de cada um dos AP com:
    • Mesmo SSID (nome de rede)
    • Cada um deve usar um canal diferente (largura de canal pode ser a mesma)
    • Mesmo modo de operação (ex: 802.11n)
    • Mesmo tipo de encriptação e senha
    • Baixa potência de transmissão
  2. Configure a interface LAN desses AP de forma que se possa acessar suas interfaces de gerenciamento. Portanto, cada interface deve ter um endereço IP único na subrede do laboratório (192.168.1.0/24)
  3. Acessem a rede sem-fio implantada usando seus celulares. Identifiquem com qual dos APs cada celular se associou.
  4. Usem o app Wifi Analyzer para mostrar que redes sem-fio estão disponíveis. Identifiquem a rede implantada, e os canais em que está disponível.

Parte 2: análise das comunicações

As comunicações numa rede IEEE 802.11 podem ser analisadas usando ferramentas especiais. A interface de rede deve operar em modo monitor, em que cópias de todos os quadros recebidos e enviados são entregues a um programa analisador. Com isso, podem-se visualizar todos os quadros transmitidos nesse tipo de rede.

  1. Cada computador do laboratório possui uma interface de rede sem-fio. Ative o modo monitor nessa interface com os seguintes comandos:
    sudo iw dev wlan0 interface add mon0 type monitor
    sudo ifconfig mon0 up
    sudo ifconfig wlan0 up
    
  2. Em um terminal, execute o wireshark:
    sudo wireshark
    
  3. No wireshark, ative a captura na interface mon0.
  4. Observe os quadros capturados. Identifique os tipos de quadros transmitidos na rede, analisando seus cabeçalhos (veja este capítulo de livro).
  5. Procure quadros do tipo beacon. Esses quadros são enviados pelos pontos de acesso (AP), e anunciam a existência de uma rede sem-fio com um certo identificador.
    • Identifique os quadros beacon da rede sem-fio da nossa experiência.
    • Observe as características da rede sem-fio que estamos usando
  6. Obtenha o programa wl-stats.
    • Mude sua permissão para que possa ser executado como programa:
      chmod +x wl-stats
      
    • Execute-o durante um minunto, e depois termine-o teclando CTRL C
    • Leia o sumário apresentado pelo programa. Veja quantos quadros são transmitidos, e quanto tempo a rede é de fato utilizada.
  7. O professor irá configurar dois computadores no laboratório para usar a rede sem-fio implantada, tendo o cuidado de fazer com que cada um se associe a um diferente AP.
    • Um dos computadores deve gerar tráfego em broadcast
    • No outro computador deve-se monitorar a comunicação com wireshark. É possível visualizar os quadros em broadcast enviados pelo primeiro computador ? Isso evidencia que as redes sem-fio dos diferentes AP estão integradas em uma única LAN.

Parte 3: mobilidade na rede sem-fio

  1. Acessem algum site de streaming (ex: Youtube ou Netflix), e inicie a reprodução de um video longo.
  2. Para simular a transição de BSS (mudança de AP), os AP serão desligados alternadamente.
    • Observe o que acontece com a reprodução dos videos enquanto isso. Ela continua como se nada tivesse acontecido ? Ou ela continua com algumas interrupções ? Ou ela interrompe definitivamente ?
    • Verifique se seu celular mudou de AP de forma transparente (sem precisar de sua intervenção)

Parte 4: Um ESS com sistema de distribuição sem-fio (WDS)

Pji3-80211-wds.png
Um ESS com um sistema de distribuição sem-fio (WDS)

  1. Modifique a configuração dos AP para que formem um WDS conforme a figura acima.
    • Todos AP devem usar o mesmo canal e mesma largura de banda
    • Habilite a opção WDS Bridging, e configure as informações ali solicitadas
  2. ATENÇÃO: os AP NÃO podem estar conectados na LAN do laboratório quando em modo WDS. Somente o AP que dá acesso aos demais AP (o AP à esquerda na figura) que deve estar ligado a LAN.
  3. Após salvar e ativar as novas configurações, acessem a rede sem-fio com seus celulares
  4. Identifiquem os APs com que seus celulares se associaram
  5. Testem a comunicação nessa rede sem-fio. Há alguma diferença perceptível em relação ao DS pela rede cabeada ?
  6. Os professores novamente irão configurar dois computadores no laboratório para usar a rede sem-fio implantada, tendo o cuidado de fazer com que cada um se associe a um diferente AP.
    • Um dos computadores deve gerar tráfego em broadcast
    • No outro computador deve-se monitorar a comunicação com wireshark. É possível visualizar os quadros em broadcast enviados pelo primeiro computador ? Isso evidencia que as redes sem-fio dos diferentes AP estão integradas em uma única LAN.
  7. Um teste de desempenho deve ser realizado nos computadores:
    • Em cada um dos computadores deve-se fazer ping para o gateway do laboratório (192.168.1.1). Há diferença perceptível no tempo de resposta ?
    • Em cada um dos computadores deve-se realizar a transferência deste arquivo. Houve diferença nas taxas de transferência obtidas ?
  8. Modifique a configuração dos AP da seguinte forma:
    • O WDS deve ser realizado usando o rádio 5 GHz
    • O rádio 2.4GHz deve ser usado para dar acesso aos clientes, e cada AP deve usar um canal diferente
  9. Repita os testes de desempenho ... houve alguma diferença ?